So Ilja, 22 anos, estudava na
biblioteca da Universidade de Hokkaido quando o terremoto do dia 11 de março
atingiu, às 14h, a ilha ao norte do Japão. Abalos sísmicos são freqüentes no
país e o rapaz só procurou abrigo quando os tremores se intensificaram. Depois
que o tremor de terra passou, Ilja procurou notícias de seus familiares, mas os
telefones só voltariam a funcionar quatro horas mais tarde. Decidiu então ir a
um shopping onde encontrou vários televisores ligados e só então se deu conta
do tamanho da tragédia.
O terremoto que atingiu a costa
nordeste do Japão foi o pior já registrado no país, alcançando magnitude 8,9 na
escala de 0 a 10 que mede a intensidade dos tremores. Como o ponto central do
tremor foi em meio ao oceano, o choque causou tsunamis de 10 metros de altura
que destruíram cidades inteiras, além de provocar na usina atômica de Fukushima
um dos maiores desastres nucleares da História. Cerca de 14 mil pessoas
morreram e 9 mil continuam desaparecidas.
“Os trens só voltariam a funcionar à meia-noite
e eu andei por seis horas para chegar em casa”, relata o estudante. “Em muitas
cidades não havia água, nem energia. Estavam todos consternados.”
O último grande terremoto ocorrido no
Japão atingiu a região metropolitana de Osaka em 1995. Em 20 segundos o abalo
atingiu magnitude 7,3 e matou 6 mil pessoas, além de deixar 40 mil feridos e
300 mil desabrigados. Neste, ao contrário do que ocorreu no dia 11 de março, a
devastação se deu em decorrência dos tremores em si, e não do tsunami gerado
por eles.
Apenas três meses antes do terremoto
atingir a costa japonesa, So Ilja havia sido aceito para uma vaga como
voluntário ensinando Língua Japonesa em Manaus. As aulas seriam parte de um
projeto do Alternativo de Petrópolis, em que cursos de Inglês e Japonês seriam
ministrados a preços acessíveis à comunidade, promovendo capacitação para o
mercado de trabalho e, principalmente, para o atendimento de turistas
estrangeiros durante a Copa de 2014.
“A princípio eu não viria mais”, conta
Ilja. “As pessoas no Japão estavam muito necessitadas e eu queria trabalhar
como voluntário. Porém, a minha vinda era um compromisso com o Altpet e as
pessoas de Manaus, então decidi vir.”
So Ilja saiu do Japão apenas uma
semana após o terremoto ter atingido o seu país. Desde então tem acompanhado as
notícias através do canal japonês NHK e da internet.
“Ainda me sinto muito triste, mas não
posso fazer nada. Então decidi me concentrar no trabalho aqui em Manaus e ser
voluntário no Japão quando voltar”, afirma ele.
Ilja já está em Manaus há três meses e
já consegue se comunicar em Português. Ele mora em Petrópolis, na casa do
presidente do AltPet, e dá aulas para a comunidade duas vezes por semana. Diz
que achou estranho o café tão doce (no Japão, el é tomado sem açúcar) e o
almoço, e não o jantar, ser a refeição mais importante. Quando chegou à cidade,
foi recebido no aeroporto com um abraço por um dos membros da organização que o
trouxe. Demonstrações físicas de afeto não são comuns na cultura japonesa e
Ilja conta que ficou “petrificado”.
“As pessoas foram muito gentis comigo
desde o começo. No início foi estranho, mas agora eu mesmo já estou trocando
beijos e abraços como todo o mundo”.
Como o custo de uma ligação para o Japão
é alto e os seus pais não sabem usar o Skype, Ilja não fala com eles desde que
saiu do Japão. O único meio de comunicação entre ele e sua família são os
e-mails que trocam freqüentemente. Ele conta que os pais gostam de ler a
respeito do Brasil e de Manaus e dizem para que ele “tenha cuidado”.
No Japão, é comum as pessoas saírem à
meia-noite nas ruas sem qualquer problema. Os índices de criminalidade no país
vêm caindo constantemente há mais de oito anos. Entre 2009 e 2010, as
ocorrências violentas caíram 6,9%, acompanhando a recuperação econômica do
país. Em Manaus, as pessoas insistem para que Ilja não saia sozinho,
principalmente à noite. Morando no bairro de Petrópolis ele viu, pela primeira
vez, uma pessoa portando uma arma de fogo.
“Eu fiquei com muito medo e voltei
para casa correndo”, ele conta. “Apesar disso eu sei que as pessoas de Manaus
são boas e muito felizes. Japoneses não falam muito e leva-se tempo para
construir um relacionamento, enquanto aqui eu já tenho diversos amigos.”
Por Felipe Libório
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